Review – Shirobako: Um anime sobre como animes são produzidos e as pessoas que trabalham neles
Sinopse
Cinco amigas pertencentes a um clube de animação do colégio fazem uma promessa de conseguirem entrar na industria da animação japonesa, se reencontrarem e um dia produzirem um anime juntas. Anos depois cada uma delas continua correndo atrás de seus sonhos, mas a industria que elas tanto admiravam não era exatamente o que elas pensavam.
Análise
Apesar da comparação inicial obvia com Bakuman – um anime sobre dois mangakas tentando vencer na vida – Shirobako toma uma rota bem mais arriscada: O anime não te introduz passo a passo na industria da animação – que é muito mais complexa que a de mangás – como Bakuman faz com a industria de mangás. Ao invés disso, te joga direto no meio do turbilhão, com você acompanhando uma das personagens principais no cargo de “produtor assistente” já a alguns meses na industria, tendo que conviver com uma rotina de trabalho quase inumana. Por uma lado é legal pelo história já começar movimentada, de modo que mal acaba o primeiro episódio e já tá tudo dando errado, por outro, boa parte das pessoas vão ficar completamente perdidas nos primeiros episódios, que te mostram muito e explicam pouco (fiz até um post na época explicando o básico pra tentar dar uma ajuda a quem estava perdido, aqui).
Para quem já pesquisou ou acabou lendo sobre como animes são produzidos esse anime é algo muito interessante por confirmar várias coisas que antes eram mais boatos ou “achismos”. Aquelas perguntas que a maioria das pessoas se faz com frequência: “porque eles decidiram por um final original?”, “porque só adaptaram até essa parte do mangá?”, “porque o design do personagem mudou comparado ao original?”, “porque esse episódio ficou mal feito?”, “porque esse CG está tão ruim?”, dentre outras, são respondidas pelo próprio anime. Também é comum vermos relatos de como a industria de animes no japão é cruel (exemplo), mas é a primeira vez que vemos um anime abordar isso de forma “relativamente” realista. Quanto mais o anime passa mais o telespectador se pergunta: “porque alguém escolheria essa profissão?”, o que é inclusive uma das indagações frequentes da protagonista. Felizmente, Shirobako, embora tenha drama, é um anime pra cima, que tenta contornar as dificuldades, e não dramatizá-las.
Ao meu ver a primeira metade do anime, mesmo que boa, não é a melhor forma de se vender a proposta, a não ser que você seja um “nerd de animação” ou alguém de dentro da industria se divertindo vendo alguém fazer um anime sobre o seu trabalho. São diversos cargos e nomes técnicos pulando na tela um atrás do outro, e quase zero explicação do que eles fazem ou significam exatamente (até tentar adivinhar com dicas visuais é difícil nesse caso). A segunda parte do anime já se sai bem melhor, tanto pela direção parecer que relaxou um pouco, deixando o clima do anime mais leve e bem humorado, quanto pelo cuidado de explicar melhor o que acontece nas etapas de produção, com direito aos mascotes do anime – representações hilárias da mente da protagonista central trabalhando – narrando tudo, para que o público entenda o que está acontecendo. Se o foco da primeira parte foi uma produção após ele começar a passar na TV, a segunda expande isso, mostrando também o passo a passo que um anime passa desde que o estúdio é escolhido até o anime começar a passar na TV (pre-produção).
As homenagens a “Inicial D” (anime de corrida) são legais, e as fugas de um certo diretor de episódio são engraçadas e mantem o clima do anime leve, assim como o produtor executivo prendendo o diretor em uma gaiola pra ele terminar o storyboard a tempo, mas no episódio 23 a coisa escalou do exagero cômico para a fantasia. Quem não se importa com o mínimo de realismo não deve se incomodar, mas para um anime que parece tentar mostrar de forma realista como a industria da animação funciona aquilo foi desnecessário – mesmo que sem duvida alguma seja uma sequência inspirada. Eu gostei muito das cenas cômicas (tem muitas!) que nos transportavam para a imaginação do diretor ou representavam visualmente duvidas e frustrações dos personagens, mas transportar aspectos da fantasia pro mundo real é uma decisão no mínimo discutível (jurava que no final iam dar a entender que era tudo imaginação do diretor, mas não). O último episódio também tem uma parte meio exagerada (se pergunte porque não mandaram aquilo digitalmente), mas foi uma forma criativa de dar um climax final “emocionante”(e engraçado) ao anime.
Todo o elenco reunido |
Existem 5 protagonistas e uma montanha de coadjuvantes em Shirobako, cada um trabalhando em uma área diferentes da industria. Todos acabam ganhando atenção em algum momento, de modo a permitir que o telespectador entenda como cada cargo funciona: direção, coordenação de produção, animação, direção de episódio, direção de animação de episódio, designer de personagem, background, CG, roteiro e dublagem. Todas as principais dificuldades, duvidas e frustrações de cada profissão são abordadas pelos personagens em algum momento, o que além de interessante dá um tom mais realista a coisa toda, principalmente por muitos ali serem novatos no que fazem. O modo como ninguém é perfeito, sendo que mesmo quem está dando concelhos para um novato em um momento pode estar desesperado ou perdido no outro, torna os personagens extremamente identificáveis para com o público, afinal, são nossos defeitos que nos tornam humanos.
No fim, Shirobako não é só um anime sobre fazer animes, mas sim sobre as pessoas que trabalham no mundo da animação e sua luta diária – com o anime tendo inclusive uns episódios meio parados na primeira parte para trabalhar melhor esses personagens. Você não dá muito por eles no início, já que são muitos e o anime não pode ficar focando muito tempo em cada um (fora a Miamori). Ainda assim, depois de um certo tempo, você vai estar torcendo para cada um deles, até aqueles que você detestava no início (menos o editor do mangaka……). Só alguns conseguem um desenvolvimento mais marcante, mas todos eles terminam muito bem caracterizados. Quando o último episódio acaba, você, muito provavelmente, vai querer ver mais, saber o que vai acontecer com aqueles personagens no futuro, como será a próxima produção deles, como a carreira deles vai progredir. Isso é desnecessário, levado em conta que o anime fecha muito bem tudo o que começou no primeiro episódio, mas só o fato de fazer a pessoa pensar sobre isso já mostra que a obra fez muito bem o seu trabalho, não só de mostrar como animes são feitos, mas de fazer você se importar e dar valor a quem trabalha neles.
Aspectos Técnicos
A direção de Shirobako (Tsutomu Mizushima) é muito inspirada, e você realmente consegue ver o diretor nas cenas, ainda mais se você conhece os trabalhos mais recentes dele. O roteiro (Mishiko Yokote) merece um elogio conjunto, já que quem criou a história é o diretor, o roteirista apenas a colocou em ordem no papel – o que não deixa de merecer elogios em animes originais, aonde se faz necessário criar todos os diálogos do zero. E diálogos é algo em que esse anime se sai muito bem. Como já mencionei antes, meu único desgosto foi a introdução de alguns elementos fantasiosos no mundo real e o modo como o anime pode deixar quem não entende nada do assunto bem confuso no início.
A parte técnica (P.A Works) relativa a animação não é necessariamente um destaque, mas nunca deixa a desejar. Ela entrega o que se pede de cada cena, principalmente nas variações de expressão cômicas dos personagens e nas cenas mais fantasiosas, aonde ela é mais exigida.
A trilha sonora (Shiro Hamagushi) não foi um destaque pra mim, mas cumpria bem o que era exigido seja nas partes cotidianas, cômicas ou dramáticas.
Conclusão
Shirobako é um anime de pessoas batalhando na vida por seus sonhos na industria da animação, uma área complexa, dura e pouco recompensadora. Mesmo com um início não tão acessível – e as vezes até parado demais – para a maioria do público, é um daqueles animes que sem duvida posso dizer que melhora muito com o tempo, tanto pelo direção ir ficando mais relaxada e divertida, te gerando mais informações e menos duvidas, como por conseguir que você se importe cada vez mais com os personagens. O anime não é perfeito, mas dentro da temática complicada que aborda, o número de personagens e o tempo que tem para trabalhar isso tudo, ele se sai muito bem. Para quem sempre quis saber como animes são produzidos, ou mesmo se interessa pela vida dura de pessoas buscando seus sonhos, esse anime é extremamente recomendado.
Direção: 9/10
Roteiro: 9/10
Animação: 8/10
Soundtrack: 9/10
Entretenimento: 7/10
Entretenimento: 7/10
Nota final: 9/10
Trailer do anime: