Persona 5 – Sociedade, Psicologia e Esoterismo
Nota: Pode conter spoilers. Para quem esta vendo Persona 5 The Animation, esta é uma análise de elementos do jogo. O post é um trabalho conjunto (e um bate papo) dos redatores Marcelo e Sirlene sobre suas impressões subjetivas do jogo.
Marcelo – Tentando trazer um estilo novo de review para o site, a Sirlene acabou me pressionando convidando para conversarmos sobre Persona 5 e tentar algo diferente por aqui, e não, isso não vai se chamar Personamanais.
Sirlene – Ahaha. É uma pena, já que Persona 5 tem conteúdo o suficiente para vários posts semanais, mas não vamos intoxicar os leitores com o spin off de Shin Megami Tensei.
Agora, devemos admitir que é fantástico um RPG, que poderia ser considerado retrógrado pelas mecânicas de turnos, conseguir o Game Wards de melhor RPG em 2017. O produto não teria sido superestimado? Alguns podem até se fazer esta pergunta por ser um gênero quase abandonado atualmente.
Mas como sempre, não se deve julgar um livro pela capa, mas pelo que contém no seu interior. E vamos admitir que o interior de Persona 5 é uma obra de arte.
Uma explosão de cores e design bem harmonizados que faz inveja a qualquer concorrente, mas este ainda não é seu principal destaque, apenas estilo não vende um jogo.
Marcelo – Sendo assim, vamos entrar um pouco mais no estranho mundo do Metaverse, e entender melhor como cada um dos pontos se relacionam, e os significados por trás daquilo que dá nome a franquia.
Sirlene – De fato Persona já é uma escolha de título bem peculiar e interessante para uma série de jogos. Isto porque o nome e muitos conceitos usados no jogo, como shadow e as máscaras, são coisas baseadas na psicologia de Jung, mas que acabaram se mesclando muito bem na temática dos jogos.
Que como Shin Megami Tensei, foge um pouco da fantasia comum, ao se mescla a uma fantasia com embasamento em temas da realidade moderna, com adento que Persona explora bastante as personalidades e problemas envolvendo o psicológico dos adolescentes, que é um de seus focos centrais.
Sendo bem evidente que o sistema social do jogo é um dos seus principais destaques, se não uma das características principais de seus antecessores que foi um pouco mais aprimorada neste título mais recente.
Marcelo – Realmente, essa foi uma das coisas que mais me chamou atenção para a série. Essa questão de trabalhar um lado mais psicológico e subliminar dos personagens. Acho legal dizer aqui, que Persona 5 foi o meu primeiro jogo da série Persona, então não tenho uma noção muito grande de como funcionava os sociais links antes, mas posso dizer, com certa confiança, que foi uma das partes que mais me chamou atenção, devido a quão viva a cidade passa a ser a medida em que você vai explorando a história.
Sirlene – Também gostei bastante dessa característica do jogo de ter um mundo bem amplo mesmo com as limitações do mapa. Explorar a cidade e organizar seu cronograma de atividades diárias é algo bastante prazeroso durante a jogatina.
Já que você pode, desde explorar palácios com seus aliados, a estudar para prova de geografia, sair para a lanchonete com os amigos ou ir para a acadêmia.
E esta multiplicidade de escolhas faz o jogador se sentir realmente um estudante de ensino médio que está inserido no contexto de uma metrópole. Aliás, o fato de você poder desencadear uma variedade de diálogos com os outros personagens, e até com os próprios inimigos durante as suas aventuras é algo que me surpreendeu.
Não torna o gameplay aquela coisa monótona e mecanizada. Inclusive, este título te força a fazer interações sociais já que elas são necessárias para o seus confidentes e progresso no jogo.
Marcelo – Sim, exatamente. Os confidentes entram como uma mecânica extra para o esquema de evolução do personagem, onde você precisa ser ativo para conseguir novas habilidades e opções de combate.
Além disso, para quem queria entender melhor como funciona toda essa história de Personas, como era meu caso, essa função do jogo acaba sendo um prato cheio, já que te instiga a entender como funciona a personalidade dos seus aliados, e como isso está diretamente ligado as cartas do tarô, e todas aquelas leituras que podem ser feitas em cima.
Sirlene – A leitura das arcanas também é algo essencial neste jogo e que confere uma pegada mais esotérica para o titulo, mas que se mescla perfeitamente a temática porque a leitura de tarô está bastante ligada a essência das pessoas e como compreender seus destinos a partir das características que elas apresentam para o mundo.
Visto que cada carta de tarô tem suas interpretações que podem variar dependendo de algumas situações. O protagonista receber a carta do louco já revela muito da jornada do Joker.
Principalmente porque esta carta costuma ser considerada a número zero , mesmo sendo a última, ou seja, ele é o início e o fim do baralho, construindo com clareza a ideia de um ciclo.
Sendo uma arcana associada a impetuosidade, ou imprudência, que é uma das características do protagonista e a descoberta de novos horizontes.
O que casa bem com o Joker. Que realmente começa vazio e sem perspectiva dada a sua situação, mas que por ser praticamente vazio também têm infinitas possibilidades de evolução.
Marcelo – O Joker é um personagem interessante justamente por conta disso que você falou sobre as cartas. Ele está ali em um processo de redescobrimento, aprendo a aceitar as decisões que fez, e encontrar a sua reabilitação, como o próprio Igor trata o caso dele.
O fato do seu coração também ser representado por uma cela deixa isso claro. Ele está na situação em que está, porque assim decidiu, e é através desses novos relacionamentos e descobertas que vai se libertar da prisão que ele mesmo criou.
Sirlene – Foi bom você tocar no assunto do prisioneiro, já que praticamente todos os personagens desse jogo são prisioneiros. Sendo bem claro que eles estão presos as pressões, principalmente sociais, em seu psicológico.
O que é bem explanado em como as situações e problemas acabam reprimindo o eu dos personagens de se expressar livremente e os aflige de formas bastante significativas de diversas maneiras.
Desde de se trancarem dentro de um quarto, e se isolarem do mundo exterior, a praticamente tentarem se omitir e serem mais reservados como fez o protagonista no início de sua jornada como herói .
Inclusive os vilões, as sombras, também são prisioneiros. Prisioneiros de seus desejos ou da forma como o mundo se expressou neles e eles o veem a partir de sua persona.
Alias, a sombra também é uma parte da persona, ela esta relacionada a nossos desejos mais fortes e profundos e que se torna negativa quando expressa de maneira muito agressiva.
Como no caso dos vilões que suplantaram totalmente o seu eu com anseios e sentimentos ligados a sua persona, a ponto de não mais distinguirem um do outro.
Marcelo – Esse lado mais psicológico da série também engloba um dos temas que acho bem interessante: inconsciente coletivo. Além de todos esses aspectos que a Sirlene levantou sobre a maneira como os personagens se enxergam perante os outros, e como isso se reflete nas suas sombras, o Memento, lugar do Metaverse onde os jogadores podem explorar, funciona como uma grande rede do inconscientes coletivos da cidade.
O jogo trabalha essa mecânica de uma maneira bem legal, onde a popularidade do grupo influencia em quão longe você pode explorar o local, criando uma junção interessante entre aquela típica limitação dos RPGs, com algo da própria série.
Sirlene – E talvez este seja o principal diferencial dessa série, o quanto ela consegue mesclar temas mais elaborados envolvendo o campo da psicologia, e problemas sociais presentes na sociedade moderna japonesa, com elementos fantásticos.
Ao ponto de criar uma história viva e complexa na qual não tem como o jogador não se identificar com os personagens e sentir que eles são realmente profundos.
E ao mesmo tempo em que você tem este enredo mais envolvente e rico, os produtores desenvolveram mecânicas no gameplay que se mesclam a estas características mais subjetivas da história e que também pegam aspectos do próprio cotidiano de um típico estudante japonês.
Marcelo – Esse lado slice of life é outro dos pontos positivos do jogo, e que acabou sendo bem elogiado por conseguir aprimorar ainda mais a experiência que os antigos já tinham.
Você realmente passa pela vida de um estudante japonês, daqueles bem comuns de animes, indo do famigerado episódio fanservice de praia, até os populares festivais de fogos de artifício que, mesmo caído nos típicos clichês do gênero, ainda conseguem ser divertidos e interessantes.
Sirlene – Mas algo que eu realmente gostei dessa parte mais cotidiana foi o fato que o jogo também te obriga a ter que arrumar um emprego de meio expediente para comprar roupas e equipamentos.
Além de conotar bem algo bastante presente nesta sociedade, que é o fato dos estudantes, desde cedo, serem pressionados a serem responsáveis e cobrados fortemente pelos adultos.
Mostrando claramente como a sociedade japonesa é mais cruel, taxativa e julgadora neste aspecto, já que os adolescentes sempre têm que ser exemplares e seguirem um script.
Marcelo – Resumindo tudo para não deixar esse texto ainda maior, Persona 5 é um daqueles jogos diferentões, seja pela forma como usa os temas que se propõem, ou pela maneira como desenvolve as mecânicas presentes em jogos do gênero, ele entrega uma experiência única, que vai te cativando aos poucos, transformando coisas simples, como o cotidiano dos personagens, em algo grande e complexo, com diversos detalhes e pensamentos a serem explorados.
Sirlene- Definitivamente, Persona 5 é um jogo de RPG que sai da curva padrão e tenta se aprofundar em assuntos atuais e que envolvem a sociedade moderna, além de expressa de uma maneira bem artística e simbólica os conceitos de Jung.
Sempre trabalhando a ideia que a persona , parte do arquétipo da personalidade relacionado aos papéis que desempenhamos perante a sociedade, é um complicado sistema de relação entre a consciência individual e a própria sociedade.
Sendo esta premissa o centro de toda a franquia, expresso no título mais recente como uma história que se baseia no pressuposto de após nos conhecermos profundamente, o que podemos fazer para nos expressarmos de uma forma única, sem romper com nossos papéis, e fazer a diferença no mundo.
O que também esta ligado a temática de rebelião e ladrões, já que o mundo pode nos tornar aprisionados, ou seja, que as vezes é necessário fugir de alguns scripts e ir contra regras impostas.
O que é bem visto na adolescência, já que é um período que tentamos nos firmar como seres individuais, únicos.
E nesse sentido rebelião é bom, já que vislumbra realmente a liberdade. A busca de uma forma de podermos expô nossos sentimentos e desejos perante um sistema arraigado, pois apenas o social não compõe a nossa personalidade.
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