-Eventualmente, alguém vai desenhar uma daquelas paródias da capa da LN de Ore no Imouto e publicar no pixiv. Enquanto isso não acontece, fiquem com essa imagem da Emilia moe.
-Sabe o que eu mais gosto em Maou-sama? Sempre que os personagens tentam interpretar seus papéis no palco conhecido como mundo real, suas ações são imediatamente sobrepostas pelas restrições do mesmo e da sociedade contemporânea. É o que acontece no início do episódio. A cena em que Emilia aborda Maou e o ameaça é construída cautelosamente para que a piada funcione no momento certo. Nos primeiros trinta segundos, temos uma atmosfera tensa intensificada pelos vocais e por batidas cadenciadas da música de fundo. Repentinamente, a tensão é cortada quando Maou percebe que a arma que Emilia está empunhando é uma faca comprada na loja de 100 yens de Sasazuka, e a trilha sonora cessa na mesma hora para propiciar efeito cômico. Após algumas falas, a música retorna, Emilia faz menção de atacar e os dois vão parar na delegacia.
-Voltando a Emilia, temos uma sequência de cenas em que ela sai do trabalho e cruza o distrito aproveitando as promoções que vê pelo caminho. Ela faz isso com tanta naturalidade que é difícil conceber que um dia ela foi a centro-avante na retaliação aos ataques demoníacos. A televisão aqui está servindo como instrumento de acomodação e alienação, enquanto Emilia ingere suas almondegas com olhos vazios. E isso é tão verossímil que é difícil não associar às donas de casa que veem programas de fofocas ou aos senhores de idade que assistem o Datena, ato que acaba se tornando tão natural que após algum tempo eles perdem uma noção mais abrangente de entretenimento. Quem aí não tem um parente que vive de TV Fama, Faustão, Silvio Santos, Big Brother e derivados? Por isso que eu parei de assistir TV há uns 5 anos atrás.
-E a própria cavaleira se dá conta de sua passividade e vai atrás do Maou, o único elemento familiar remanescente nesse mundo estranho. Emilia tenta convencer a si própria de que sua função como heroína ainda está em vigor, partindo do pressuposto de que Maou ainda está na ativa e pode se rebelar a qualquer momento, mas acaba frustrada quando ela própria reconhece que não é esse o caso. Maou está vivendo como um humano comportado e acatando todas as regras e dogmas sociais, o que a leva a concluir o óbvio: em um mundo de paz, não há espaço para heróis, paladinos e cavaleiros. Outro fator a ser levado em consideração é a disparidade entre a escala de moralidade do mundo real e a escala do mundo da fantasia. No mundo da fantasia, é tudo preto no branco e maniqueísta, só existindo o bem e o mal. No mundo real cada um tem uma percepção diferente das coisas, e o bom é percebido como a realização dos próprios interesses, ao passo que o mal seria o entrave aos mesmos. Vivemos em um mundo cinzento e individualista em que esse tipo de divisão está longe de ser absoluto, só sendo devidamente reconhecido na literatura, onde o autor é onisciente como um deus e estabelece todas as regras de seu próprio universo.
-Já esclarecida e conformada, ela resolve convencer Maou a viver uma vida comum em Sakasuki e desistir de retomar Ente Isla com a condição de cessar quaisquer hostilidades contra o mesmo. Maou, no entanto, não pretende dar o braço a torcer, e bate de frente com Emilia, apenas para ter seu discurso arruinado logo em seguida. Mais uma vez a quebra de tensão do roteiro funciona. Eles são atacados sabe-se-lá por quem e conseguem escapar. Os dois tomam caminhos separados, ou ao menos isso é o que Maou pensou que aconteceria. Emilia surge na porta de sua casa com a velha desculpa de que perdeu as chaves. É fácil entender o motivo, quebrando o script em partes como eu fiz aqui. Emilia experimentou quatro mudanças desde a sua chegada ao mundo humano. Primeiro, ela teve de se acostumar às normas da sociedade, aos costumes e ao modo de viver. Pouco tempo depois, ela descobre que Satan ainda está vivo e sai da caverna de Platão após reavivar a chama da justiça consolidada em seu espírito. Após observação, ela apura que assim como ela, o velho inimigo já não é tão ameaçador quando era em seus tempos áureos, o que os interliga em lugar comum criando o primeiro laço afetivo. Quando já havia se dado por vencida, outra ameaça aparece, pegando-a completamente desprevenida e obrigando-o a redefinir seu posicionamento mais uma vez. Diante de toda essa confusão e instabilidade, ela acaba por se sentir impotente e suas defesas naturais finalmente cedem (meu deus, estou me sentido o Katsuragi Keima explicando seus métodos de conquista agora). Ela reconhece sua fragilidade e sua solidão, e a única maneira de lidar com isso é indo atrás do único vínculo, o único pilar afetivo que lhe resta e que pode ajuda-la a endireitar suas bases. E esse pilar não é ninguém menos que o seu ex-aqui-inimigo, o próprio Maou.
-Trazendo para a perspectiva realista, seria a mesma sensação de inseguranças que uma mulher tem quando anda sozinha na rua, principalmente à noite, período mais propício para que as desgraças ocorram. É um cenário escuro, amorfo e repleto de seres hostis que tem no prazer a sua principal necessidade, aliado a opressão milenar de gênero. O que Maou faz é meramente intercalar o senso comum com a fantasia usando artifícios convincentes e precisos para estruturar toda sua narrativa e criar essa identificação. O romance não parece forçado e sem propósito, e consegue imitar bem a realidade. A comédia reforça todo o contexto, além de nos afeiçoar aos personagens e servir de crítica social. Agora só falta saber como será desenvolvida a trama principal, relativa aos terremotos e a esse novo inimigo. O circo já está armado, veremos agora como será o espetáculo.