As Crônicas de Arian 2 – Capítulo 16 – A Nevoa da Morte
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Capítulo 16 – A Nevoa da Morte
Quando a torre tremeu o pé de Jon se soltou e ele caiu com Zek e Joanne. O único pensamento que passou pela cabeça dele foi torcer para que ao menos Zek, que tinha resistência muito acima da humana, sobrevivesse a queda. Para ele e Joanne, não havia esperança.
Do nada, no entanto, a visão de Jon ficou negra, como se algo tivesse coberto seu rosto. No momento seguinte ele, Joanne e Zek estavam em um gramado, perto da colina onde pularam para a fortaleza de Arx. Nenhum deles tinha poder de teletransporte, o que era, por sinal, uma habilidade raríssima, então outra pessoa ou magia os havia jogado ali. Mas quem ou o que poderia querer ajuda-los? Seja quem for, já tinha desaparecido.
Havia, no entanto, problemas maiores com os quais ele tinha que se preocupar. Zek continuava desacordada e Joanne estava desmaiada, provavelmente devido ao objeto em sua mão. Como ela estava incapaz de usar magia desacordada, a maldição da relíquia estava consumindo seu braço, que no momento estava negro como carvão. A maldição já tinha chego até o cotovelo. Se passasse do ombro, não haveria mais salvação para ela.
Jon respirou fundo e fez a única coisa que poderia para ajuda-la: tentou tirar a caixa amaldiçoada de sua mão. O objeto, no entanto, parecia colado na mão de Joanne, como se realmente estivesse tentando mata-la. Pior ainda, mesmo não conseguindo mover o objeto, só de tocar nele Jon estava sendo afetado. Uma dor alucinante tomou seu corpo quando encostou no objeto na tentativa de retirar ele da mão de Joanne. Infelizmente, só o que estava fazendo era arrastar o corpo dela de um lado para o outro.
Ele então apoiou um dos pés no ombro dela, para a fazer parar de se mexer, uma das mãos segurou o pulso e a outra a caixa, e novamente ele tentou puxar a relíquia. Foi então que aconteceu, a mão de Jon entrou na pele de Joanne, até chegar nos ossos. A parte negra do braço dela começou a esticar e se soltar do resto do corpo, como se estivesse podre. Nesse momento, ela acordou gritando de forma alucinada. Não conseguia dizer nada, só gritar e chorar de dor.
Jon parou repentinamente e se controlou para não vomitar. Sua mão estava cheia de sangue e pedaços podres do braço dela.
Jon podia ouvir seu coração batendo em uma velocidade alucinante dentro do peito. Sabia o que tinha de fazer naquela situação, mas não tinha coragem.
As partes do corpo afetadas por muito tempo pela maldição não voltavam ao normal, mesmo com magia, você tinha que amputar o membro contaminado o mais rápido que pudesse para evitar que a pessoa se tornasse um amaldiçoado, e em seguida ele tinha que ser curado por uma sacerdotisa para purificar o sangue.
Jon olhou para a espada de Joanne em sua cintura, mas exitou. Ele então encarou os olhos suplicantes de Joanne, que falou com o pouco de lucidez que lhe restava.
— Entrou no meu sangue… não posso… usar magia… meu braço… arranca!
Jon olhou para o braço e depois novamente para os olhos dela. A sacerdotisa apenas fechou a boca com força, tentando controlar a dor e esperando o que viria a seguir.
— Eu… Eu não consigo.
— Eu vou… morrer… Jon…
Ela tinha razão, e seria culpa dele. De novo ele não seria capaz de tomar uma decisão simples entre salvar uma vida ou não fazer nada. Ele foi salvo de sua indecisão entre salvar Zek ou Joanne por uma entidade desconhecida, mas teria essa sorte duas vezes? Ou tomava coragem ou a pessoa que era seu motivo de viver naquele mundo iria morrer na frente dele.
Suando frio, ele reuniu toda coragem que pode e pegou a espada na cintura dela, posicionou o braço o mais longe que podia do resto do corpo e se preparou para acertar perto do ombro, onde a mancha negra estava chegando.
— Anda! — gritou ela, enquanto ela suava frio e lagrimas escorriam sem parar de seus olhos.
Jon engoliu seco, tentou parar de pensar e apenas desceu a lamina sobre o braço esquerdo dela. Joanne se contorceu e berrou, mas o braço ainda estava grudado ao corpo, o golpe não tinha sido forte o bastante. Jon a posicionou e acertou novamente, mas dessa vez acertou em um local diferente. Seu braço tremia sem parar, tanto de nervosismo quanto para o lembrar que ele não tinha pratica alguma com espadas.
— De novo! — gritou Joanne, com os olhos completamente vermelhos tamanho a dor que estava tentando suportar.
Jon respirou fundo e tentou de novo, e de novo. Só na quinta vez o osso quebrou e o braço se separou da parte escura e podre com a caixa.
Assim que Jon conseguiu, Joanne, gritando, se forçou a reunir energia celestial para estancar o sangramento no braço.
Jon caiu sentado no chão, conforme todos os músculos do seu corpo relaxavam ao mesmo tempo. Mas seu alivio não durou muito.
Pouco depois que a parte contaminada do braço se separou do corpo de Joanne, a relíquia começou a exalar uma fumaça negra por toda parte.
— Temos que sair daqui! — gritou Jon para Joanne, que ainda estava concentrada em se curar da maldição.
— Pegue a Zek! Não consigo parar a maldição com a energia que me resta, temos que correr!
Jon obedeceu, pegou um dos braços de Zek e colocou sobre o seu ombro. Infelizmente, mal tinha forças para carrega-la, mesmo ela estando sem armadura. Não pensou que fosse tão fraco assim. Seria por estar cansado ou era efeito do dano causado a sua alma pela bruxa?
Antes que pudesse pensar mais sobre isso, Joanne conseguiu se levantar e foi até eles, pegou no outro braço de Zek, apoiou sobre o seu ombro, e ela e Jon começaram a andar o mais rápido que podiam. O braço esquerdo de Joanne havia parado de sangrar e ela enrolou um pedaço arrancado de sua capa em volta da parte que Jon cortou.
Atrás deles, a fumaça negra continuava a aumentar. A perna de Jon estava bamba com o esforço de carregar Zek, e ele estava ficando sem ar. Sua visão embaçou um pouco e tinha quase certeza que iria cair desmaiado a qualquer momento. Depois de alguns metros, Joanne parou ao ouvir uma forte explosão na torre congelada. Ela olhou para cima, tentando entender o que estava acontecendo.
— Liberaram uma quantidade absurda de energia celestial… Deu para sentir ela chegando aqui… Espero que o nosso lado tenha ganho — disse ela, tentando forçar um sorriso.
Eles andaram mais vários metros em meio a um longo campo gramado, até que chegaram perto da cidade. Já podiam ver as ruas de pedra, com algumas pessoas curiosas olhando para a torre congelada, e outras assustadas fugindo ao notarem a fumaça negra cada vez maior que se aproximava da direção em que Jon estava vindo. Um barulho forte como se fosse um grito de dor vinha de dentro dela, deixando a situação ainda mais aterrorizante.
Foi então que as pernas de Jon cederam. Foi uma sensação muito estranha. Seu cérebro dava ordens a perna, mas ela não obedecia. Ele não conseguia mais sequer ficar de pé. Joanne notou o desespero dele e colocou a mão em seu ombro.
— Está tudo bem, Jon. Já fez mais que o bastante — disse ela, com a voz mais calma que pode.
Para Jon, só havia uma opção agora.
— Leve a Zek e me deixe aqui.
Joanne devia estar sentindo muita dor, mas ainda assim sorriu para ele e debochou da proposta.
— Isso é uma vingança pela escolha que te dei na torre? Se é assim também tenho direito a minha escolha idiota. Duvido que possa realizar milagres como a Lara, mas ninguém disse que não posso tentar.
A sacerdotisa se posicionou na frente dele e olhou para a fumaça negra, que se expandia e chegava mais perto rapidamente. As pessoas na cidade pareciam te-la notado também, já que podia ouvir gritos por toda a cidade. Ou era por isso ou os barulhos que vinham de cima da torre congelada devido ao embate contra Arx.
— Tem energia para parar aquela coisa?
— Parar? Não, já vou entrar no meu pagamento. Mas passo atrasa-la mais um pouco.
— De que isso vai adiantar?
— Tenha fé, Jon.
Joanne reuniu energia em sua mão direita e começou a recitar um encantamento. Em frente a ela uma parede de energia celestial começou a se formar. Era equivalente a um muro de 10 metros de altura, que continuava crescendo. A fumaça parou ao chegar na parede, e começou a se acumular. O grito que vinha de dentro dela aumento ainda mais, como se estivesse tentando forçar a parede.
— Ah droga! — gritou a sacerdotisa, contorcendo levemente seu corpo, como se tivesse recebido um pancada interna.
O braço esquerdo de Joanne que Jon cortou voltou a sangrar. Mas não era só ele, sangue saia pelos olhos, ouvido e boca. A calça também estava ficando toda vermelha.
Jon arregalou os olhos. Já tinha lido sobre aquele tipo de pagamento. A pessoa começa a sangrar por todos os orifícios até parar de usar magia, como se sua alma estivesse implorando para ela parar.
— Joanne, para!
— Ai todos nos… morremos! — Ela estava com dificuldade para falar com o sangue saindo da boca.
— Vamos morrer de qualquer forma.
— Como… disse… Tem que ter mais fé… Jon — a respiração de Joanne estava ficando fraca, e o chão a volta do corpo dela estava um rio de sangue.
Jon começou a pensar que devia ser o pior dia de sua vida. Foi violentado, perdeu parte da alma, teve que fazer escolhas horríveis e agora a mulher que ele mais prezava iria morrer na sua frente tentando salva-lo.
Sempre teve fé, mas começa a contestar a tal vontade dos Deuses em deixar tudo aquilo acontecer com as pessoas que estavam tentando salvar vidas inocentes. Onde estava a intervenção deles quando mais precisavam?
A fumaça estava forçando a barreira de Joanne, gerando um forte vendo na direção deles. Foi então que a barreira de Joanne começou a abrir e a fumaça a passar. Ela caiu sobre um dos joelhos, não tinha mais força alguma.
Ele se sentiu a pessoa mais fraca do mundo. A mulher que amava iria morrer na sua frente, e ele não tinha poder para fazer nada.
A sacerdotisa virou a cabeça para Jon e falou como se tentasse se despedir.
— Desculpe… Jon
Nem forças para dizer algo ele tinha mais, só observar, conforme Joanne virava a cabeça de volta para a fumaça tentando sua última cartada.
Com um forte grito, ela arremessou toda a energia acumulada na barreira que estava se desfazendo para frente, forçando a fumaça vários metros para trás. Em seguida caiu com os dois joelhos no chão, e eles só puderam esperar enquanto a fumaça voltava ferozmente para mata-los. Na verdade, seria ainda pior que a morte, já que virariam amaldiçoados.
Assim que a nuvem negra passou pelo seu corpo Jon começou a sentir como se toda a vida que lhe restava estivesse sendo arrancada. Pensava que não tinha mais forças para falar, mas ainda assim ele gritou, tamanha a dor que estava sentindo.
Foi então que do nada, a dor sumiu e toda a fumaça a volta deles se dissipou. Era como estar em uma bolha gigante no meio de um rio negro.
Era Zek, ela havia levantado e estava emanando um forte brilho das mãos, que estava repelindo a fumaça. Infelizmente, seu estado ainda parecia péssimo, como se estivesse drogada ou atordoada. Com o baixo controle que a garota tinha sobre energia celestial, não poderia fazer muito mais que aquilo. E foi então que aconteceu.
Para total surpresa de Jon, a fumaça inteira atrás deles se dissipou. Os trés olharam a sua volta sem entender nada, até que viram Arian e Lara passarem correndo em um cavalo, com ela na frente e Arian guiando.
— Lara, a relíquia! — gritou Joanne, com dificuldade.
— Aonde acha que eu estou indo?!
Lara colocou a mão para frente, juntou energia e arremessou. A luz da energia seguiu abrindo caminho em meio a gigantesca nuvem de fumaça a frente deles formando um túnel enorme por onde eles entraram. Em seguida, a fumaça preencheu a abertura e o túnel se fechou.
— Ela é louca… A maldição está muito forte! — disse Zek, incrédula.
Joanne não disse nada. Jon não sabia se não tinha mais forças para tal ou só estava torcendo para aquela egocêntrica conseguir mais um milagre.
Momentos depois, com uma forte explosão de energia celestial, toda a nevoa negra da área se dissipou. Ao longe, podiam ver Lara com a relíquia em mãos. Ela havia conseguido de novo. Jon não sabia se ficava feliz por terem sobrevivido ou triste por ser tão impotente no meio daqueles seres tão poderosos. Se não fosse a sacerdotisa que ele tanto odeia, estariam todos mortos.
Assim que ela voltou Jon reparou que Lara estava toda machucada, principalmente as pernas, e mal tinha roupas sobre o corpo, o que explicava porque estava usando a capa verde de Arian. Ainda assim, não parecia estar preocupada com sua situação, apenas exibia um sorriso esnobe de quem salvou o dia.
— Você está horrível — disse Joanne, totalmente pálida pela perda de sangue.
— Eu vou viver… Pelo menos ainda tenho os dois braços… — provocou Lara.
Joanne forçou uma risada.
— Eu me viro. Felizmente não foi o direit…
Antes de conseguir completar a frase, ela caiu no chão, tão pálida que não parecia ter mais vida em seu corpo.
Jon arregalou os olhos e tentou ir até ela, mas seu corpo não se movia. Zek correu até a sacerdotisa e checou o pulso.
— O coração está parando.
— Claro que está, ele não funciona sem sangue. Olha quanto sangue ela perdeu! — disse Lara, apontando para o chão a volta de Joanne.
Zek encostou no corpo de Joanne e começou a recitar o encantamento de cura, enquanto uma luz dourada saia de sua mão.
— Zek, ela precisa de sangue, energia celestial só acelera a regeneração, não vai fazer ela produzir mais sangue! Só vai conseguir um cadáver sem ferimentos externos assim!
— Mas… é muito arriscado, se o sangue não for compatível ela morre!
— E se não receber nenhum imediatamente ela vai morrer agora! — gritou Lara. Jon quase achou que ela estava de fato preocupada com a sobrevivência de Joanne.
— Eu…
Zek parecia completamente perdida. Jon sabia porque. Transferências de sangue tinham uma chance de menos de 20% de chance de dar certo naquele mundo, a maioria dos corpos rejeitava o sangue e a pessoa morria.
Jon estava quase desmaiando, mas tinha que dizer a eles antes. Era a única chance dela.
— Use o meu sangue… vai… funcionar… — disse ele ofegante, tentando conseguir ar.
— Como sabe…? Se estiver errado ela morre — disse Lara.
— Confia… em mim…
Em seguida, Jon desmaiou.
Próximo: Capítulo 17 – Alice
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